sexta-feira, 6 de junho de 2025

Bobo da Corte Triboulet, Léo Lins e a MAIOR PIADA DO BRASIL


 


 Na Idade Média, os bobos da corte eram personagens curiosos. Vestiam-se de forma ridícula, usavam sinos no chapéu e andavam entre reis e nobres dizendo o que ninguém mais podia dizer. Com uma piada, zombavam do monarca, da rainha, da guerra e da fome — e saíam vivos. Mais que entretenimento, eram uma espécie de válvula de escape simbólica do poder.

 

Mas por que os reis permitiam isso?

 

Porque sabiam que o riso tem um efeito pacificador. Enquanto o povo estivesse rindo, não estaria se rebelando. A piada desarma. Humaniza. E no fim das contas, o bobo, mesmo zombando do rei, era sustentado por ele. A ousadia era parte do espetáculo, mas com limites sutis e bem definidos — muitas vezes invisíveis, mas sempre presentes. A piada era uma uma espécie de licença poética. Diferente se fosse algo organizado e formal.

 

Um exemplo emblemático é o do rei Francisco I da França, no século XVI, que mantinha em sua corte o célebre bobo Triboulet. Triboulet fazia piadas que beiravam o insulto, inclusive com a própria majestade. Conta-se que certa vez ofendeu gravemente um nobre poderoso, e o rei, irritado, prometeu que ele seria executado. Mas, como forma de clemência, permitiu que o bobo escolhesse a maneira como queria morrer. Triboulet respondeu:

“Morrerei de velhice, Majestade.”

Francisco riu tanto que o perdoou.

 

Rir do poder era permitido, desde que o poder ainda estivesse no controle do riso.

 

Corta para 2025.

 

O humor no banco dos réus

 

O comediante Léo Lins foi recentemente condenado pela Justiça Federal por uma piada considerada capacitista. A juíza Gabriela Serra Siqueira argumentou que a fala dele “não estava protegida pela liberdade de expressão”, pois teria ultrapassado o campo do humor e se tornado ofensa real. Com base na legislação que pune discursos discriminatórios, a decisão causou polêmica, elogios e indignações em diferentes campos da sociedade. 

 

Mas a condenação levantou uma questão mais ampla: piadas têm licença poética?

Ou, em outras palavras: o que separa o humor do crime? E quem está autorizado a fazer essa separação?

 

Historicamente, o humor sempre caminhou na linha tênue entre o aceitável e o ofensivo. É por natureza transgressor. O riso nasce do inesperado, do absurdo, do exagero — e, muitas vezes, do desconforto. Não existe humor sem risco. E por isso, quando a justiça entra no palco para decidir o que é ou não engraçado, algo se perde. Talvez não o direito do ofendido — que deve ser respeitado —, mas a liberdade de incomodar.

 

Se os reis medievais toleravam (e alguns patrocinavam) piadas sobre si mesmos, mesmo em regimes autoritários, por que democracias modernas parecem mais sensíveis a certos temas? Por que o comediante de hoje é punido por chocar, enquanto o bobo da corte era celebrado por fazer o mesmo?

 

A piada que ninguém quer ouvir

 

Entre tantas polêmicas sobre os limites do riso, há um tema que raramente vira piada: o roubo do INSS, por exemplo. A tragédia silenciosa de milhões de brasileiros que pagam tributos por décadas e se aposentam com valores miseráveis, enquanto verbas públicas somem em esquemas escusos que raramente resultam em prisão ou devolução de dinheiro.

 

Será que a maior piada de mau gosto não é essa?

Será que rir de uma deficiência é mais grave do que silenciar diante da humilhação institucional que é envelhecer no Brasil?

 

Léo Lins foi condenado por dizer o que muitos consideraram inaceitável. Mas quem será responsabilizado pelas “piadas” que o Estado faz com a dignidade do povo? E aqui não vou entrar na narrativa se o problema é do Governo Lula ou Bolsonaro. A difamação do roubo a aposentados e pensionistas está acima desses governos.

 

A fronteira entre o humor e o crime é real — mas ela também é política. E talvez, no fim das contas, o que determine se uma piada será tolerada ou condenada não seja o seu conteúdo, mas o seu alvo.

 

Como na corte de Francisco I, o bobo ainda pode rir — desde que saiba até onde pode ir.

E desde que o rei continue achando graça.

Pense nisso!

Pedro Henrique Curvelo

Junho de 2025

segunda-feira, 21 de abril de 2025

Papa Francisco: In Paradisum, uma despedida de fé e humanidade

 




A morte de Papa Francisco marca não apenas o fim de um pontificado, mas o encerramento de uma era que tocou os corações além das fronteiras do Vaticano. Jorge Mario Bergoglio, o primeiro papa latino-americano, argentino de alma simples e profunda humanidade, despediu-se do mundo exatamente como viveu: com ternura, coragem e serenidade.


Francisco nunca se limitou aos muros de Roma. Seu papado foi itinerante e presente — visitando favelas, campos de refugiados, prisões e zonas de guerra. Aqui no Rio de Janeiro, por exemplo, pegou engarrafamento no Centro da Cidade (rs).  Mais do que um chefe de Estado, ele foi um pastor que buscou as ovelhas, principalmente as mais esquecidas. Foi no diálogo aberto com diferentes religiões, na acolhida dos imigrantes e no apelo constante à paz que ele se tornou uma referência moral em tempos tão divididos.


Sua simplicidade sempre foi sua marca. Desde o dia de sua eleição, recusando as vestes luxuosas e optando por morar na Casa Santa Marta ao invés do Palácio Apostólico, Francisco se apresentou ao mundo como alguém que queria servir, e não ser servido. Ele trouxe a leveza da humildade e a força do exemplo para um papado que sabia ser observado em cada gesto. Fez piada, com forma carinhosa, dizendo que "brasileiro não tem salvação. Muita cachaça e pouca oração". 


Mas sobre seus ombros repousavam pesos enormes: a idade avançada, as doenças que progressivamente fragilizavam seu corpo, e também as críticas severas. Francisco foi acusado por alguns de heresia, de relativizar princípios inegociáveis da fé. Outros o atacaram por suas posturas sociais, associando sua defesa dos pobres e dos marginalizados a um alinhamento com ideologias de esquerda, especialmente o comunismo — acusações que ele, com paciência e doçura, enfrentava sem perder sua missão de construir pontes.


Sua história pessoal sempre foi marcada por desafios. Durante a ditadura militar na Argentina, Bergoglio lidou com tensões internas na Igreja e na sociedade, enfrentando dilemas morais e acusações das quais, mais tarde, foi absolvido. E em tempos mais recentes, na pandemia da COVID-19, Francisco ofereceu palavras de consolo ao mundo, rezou sozinho sob a chuva na Praça de São Pedro deserta e recordou a humanidade de todos nós, frágeis e interdependentes.


Agora, com sua partida, os olhares se voltam para o Conclave que escolherá seu sucessor. Será o próximo pontífice um “Francisco II”, alguém que continuará o caminho de diálogo, simplicidade e abertura? Ou a Igreja optará por um perfil mais conservador, buscando um reequilíbrio interno diante das resistências que Francisco enfrentou? As especulações já fervilham, e os cardeais carregarão a responsabilidade de decidir o rumo da Igreja em um mundo tão necessitado de esperança.


Independentemente do que venha, a trajetória de Papa Francisco permanecerá luminosa. Sua despedida, ocorrida após a celebração da Páscoa — símbolo maior da renovação da vida para os cristãos —, parece um sinal providencial. Francisco partiu na plenitude do seu serviço, deixando sementes plantadas em corações de todas as nações.


Ele nos ensinou que a fé não é um fardo, mas um encontro; que a Igreja não é uma fortaleza, mas um hospital de campanha; que a autoridade não se impõe, mas se oferece em serviço. Francisco nos deixa, mas seu legado permanecerá como um farol para os dias escuros e como um sopro de misericórdia para os tempos que virão.


Luz para a alma de Francisco

Pedro Henrique Curvelo

21/04/2025

sábado, 5 de abril de 2025

Jogo da Anistia




Anistia, Justiça e a Medida do Absurdo

O Brasil vive, mais uma vez, um daqueles momentos em que a história se repete — primeiro como tragédia, depois como incoerência. Os atos de 8 de janeiro de 2023, com a invasão e depredação dos prédios dos Três Poderes em Brasília, foram uma tentativa desastrada e violenta de ruptura institucional. Um episódio vergonhoso. Mas também um espelho incômodo: o país que ali se revelou não foi só o da extrema-direita em fúria, mas também o da Justiça seletiva, da espetacularização do castigo, e do silêncio sobre os verdadeiros articuladores.

O peso da pena: entre a dose e a impunidade

Desde então, o debate sobre a punição dos envolvidos ganhou força — e com ele, a velha discussão sobre anistia. Mas não é só sobre anistiar ou punir. A questão central é a dose da pena. Porque no Brasil, a dose nunca é neutra: ela costuma ser mais amarga para o pobre, o desinformado, o fanático de base — e mais suave, quase doce, para o poderoso que pensa, planeja, lucra e manipula.

A mulher que passou batom na estátua da Justiça, por exemplo, recebeu mais de 14 anos de prisão. Catorze anos. Por vandalismo simbólico. Enquanto isso, o STF flexibiliza as regras para traficantes condenados em segunda instância, permitindo progressão de pena ou revisão de condenações com base na quantidade da droga — decisões que, embora debatíveis, revelam uma Justiça mais flexível com crimes potencialmente mais letais para a sociedade.

E quanto a nomes como Eduardo Cunha e Sérgio Cabral, ambos condenados por corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha? Estão soltos. Já sorriem em entrevistas. Já ensaiam articulações. Foram responsáveis pelo desvio de bilhões, desmontaram políticas públicas inteiras, e ainda assim, circulam livres. Isso não é anistia informal? Não é impunidade com toga e protocolo?

A pergunta se impõe: por que a mão do Estado é tão pesada para quem pinta uma estátua, mas tão leve com quem saqueia o país?

Lula, FHC e o peso das narrativas

Nos anos 90, o então deputado federal Luiz Inácio Lula da Silva foi um defensor ativo da anistia a militantes do MST, grevistas e trabalhadores perseguidos por ocupações e protestos. Naquele contexto, Lula denunciava a “criminalização da luta social” e defendia que o Estado não podia tratar como criminosos aqueles que lutavam por terra, moradia e dignidade.

Agora, presidente da República, Lula assiste a um movimento — muito diferente em natureza, mas semelhante em clamor — pedindo anistia para os envolvidos nos atos golpistas do 8 de janeiro. É claro que as motivações não são comparáveis: um lado reivindicava justiça social; o outro rejeitava a democracia em nome de um messianismo autoritário. Ainda assim, a incoerência mora na política: por que a anistia vale para os “nossos”, mas não para os “deles”?

A justiça não pode ser guiada por afinidade ideológica. Se ela vale, deve valer para todos — inclusive para os que desprezamos. E é aí que a democracia se testa de verdade.

Ditadura: o pacto da anistia e o silêncio imposto

A anistia mais marcante da história brasileira ocorreu no fim da ditadura militar. Em 1979, sob pressão política e social, foi aprovada uma lei de anistia que perdoou tanto os perseguidos políticos quanto os agentes do Estado que os torturaram, assassinaram e ocultaram seus corpos. Foi um pacto cínico, travestido de reconciliação, que impediu o país de fazer justiça com os crimes da ditadura.

Essa anistia foi ampla, geral e irrestrita. Protegeu torturadores, escondeu arquivos, silenciou vítimas. Não foi pacificação — foi esquecimento. Um esquecimento que custou caro. E que mostra o risco que corremos quando confundimos paz com impunidade.

Conclusão: Justiça para quem?

O debate sobre anistia, hoje, não pode ser desconectado da pergunta mais dura de todas: para quem é feita a Justiça brasileira? Quando a punição é seletiva, ela deixa de ser Justiça. Quando a anistia é política, ela deixa de ser reconciliação. Quando a pena vira espetáculo, perde a pedagogia e vira vingança.

É preciso punir os atos de 8 de janeiro. Mas é preciso punir de forma justa, proporcional e — acima de tudo — coerente. Não se trata de passar pano. Trata-se de lembrar que a democracia não se protege com injustiças seletivas. E que um país que perdoa corruptos, mas destrói a vida de fanáticos desinformados, está apenas criando o próximo ciclo de radicalização.

Pense nisso: Enquanto temos fome de sangue das marionetes do 8 de janeiro, os articuladores estão alimentando a arena com narrativas políticas e no final estão ganhando em cima desse jogo. 


Pedro Henrique Curvelo

Abril de 2025

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2025

Se Faça de Maluco e Sobreviva: A Estratégia que Ninguém Espera



Vou começar essa reflexão com uma história bíblica: Davi, o rei que derrotou Golias, certa vez teve medo da represália de um rei (Aquis, rei de Gate). Para ganhar a confiança desse rei e mostrar que não era uma ameaça, fingiu que era louco para sobreviver (1 Samuel 21:10-15). Começou a babar na barba e a rabiscar portas. Essa foi a estratégia que o livrou da morte. Não era covardia, era inteligência. Se ele tivesse escolhido enfrentar o inimigo de frente, seria só mais um corpo no caminho.

Às vezes, insistir na racionalidade ou no orgulho é o caminho mais rápido para a derrota. Fazer-se de louco é uma escolha madura quando o foco é a sobrevivência. Não se trata de ignorância, mas de estratégia.

No jogo da vida, é necessário saber quando se afastar da batalha para vencer a guerra. Isso envolve olhar a longo prazo, ter um propósito maior e não responder com velocidade a uma “obviedade do presente”. Quem leva tudo a sério demais acaba sendo peão no tabuleiro de alguém. Faça-se de louco e viva para jogar outro dia. Inclusive, essa é a única maneira de vencer algo ou alguém que é mais forte que você.

Faça-se de louco e burro diante de um mundo insano. Mas lembre-se:

Em circo de malucos, bata palmas e fique de olho na saída de emergência.

Deixe o show continuar, mas, na primeira oportunidade, saia desse meio. Você tem um propósito maior.

Pense nisso!

Pedro Henrique Curvelo
Fevereiro de 2025

segunda-feira, 21 de outubro de 2024

Rachaduras no Bolsonarismo

 


Esse período de eleição municipal revelou duas rachaduras no Bolsonarismo:

Primeiro o efeito Marçal em São Paulo. Pablo Marçal no cenário político não se torna ameaça para a esquerda. E sim para a direita. A fatia de votos que ele tira da direita se mostrou no primeiro turno em São Paulo. Seu discurso agressivo, debochado, com frases de efeito em um contexto de empreendedorismo, autoajuda e até religioso, encantou boa parte do eleitorado que deixou de votar no Nunes do Bolsonaro.

Não é a toa que o próprio Bolsonaro o atacou e depois o Silas Malafaia. Que até então se porta como um aiatolá do ex-presidente. Tudo bem que sobre o Malafaia, não foi só o Marçal que apanhou, o próprio Bolsonaro tomou uma chamada de "omisso" e "covarde" no sentido de que poderia ter sido mais protagonista nas eleições da cidade de São Paulo.

A segunda rachadura tem relação direta com os evangélicos. E aqui entra a figura do Deputado Federal e também Pastor Otoni de Paula Junior (MDB - RJ). Ao rasgar elogios ao Presidente Lula reconhecendo que os programas sociais ajudaram muito os evangélicos, como minha Casa Minha Vida, Prouni e outros. Tentou equilibrar o discurso dizendo que não votou no Lula. Mas, agradecer publicamente mostra um distanciamento do Bolsonaro. O efeito no Rio de Janeiro foi claro: Apoiou Paes ao invés do Ramagem, candidato do Bolsonaro.

E aos poucos o PT vai aumentando a articulação com a bancada evangélica. De acordo com a Folha de São Paulo, já se estima um acordo com 90 deputados da bancada.

Com essas rachaduras, os votos que o Bolsonaro recebeu começam a se dispersar para as próximas eleições. Vai se perdendo a centralidade. O discurso religioso, de guerra espiritual, muito presente na última eleição presidencial não ganhará força porque não terá um único inimigo. No jogo político a pior coisa é quando a definição de adversário se torna plural. Sendo mais de um, o candidato precisa dividir a narrativa e energia.

Ainda dentro do apoio dos pastores midiáticos, existe um fator de dúvida com relação a Igreja Universal. Tudo vai depender da mudança que haverá na presidência da Câmara dos Deputados agora em 2025. O vice-presidente da Câmara, deputado Marcos Pereira (Republicanos), tem buscado apoio do Presidente Lula. Ora, não podemos esquecer que Marcos Pereira é bispo licenciado da Universal e o próprio Partido Republicanos é da Universal. Se Lula apoiar, naturalmente a Igreja apoia o PT em 2026. Se criar essa aliança, não veremos mais a cena do Bispo Macedo colocando as mãos na cabeça de Bolsonaro e nem de nenhum dos seus aliados.

Vale lembrar que Republicanos, PL e União Brasil foram os partidos que mais ganharam prefeituras no Brasil.

Dentro da esfera política a formação da nova mesa da Câmara dos Deputados em 2025 irá apontar se as rachaduras no Bolsonarismo irão aumentar.

Por fim, o eleitor comum precisa acalmar o seu coração e não romantizar a política. Muito menos beatificar o que não pode ser santificado. Política é jogo do poder. E nessa relação acordos e discursos são feitos e desfeitos na mesma velocidade.

Procure entender mais sobre o jogo político.

Aprenda a sobreviver e blindar os seus interesses.

E, principalmente, não sofra por causa de político.

Pense nisso!

Pedro Henrique Curvelo

Outubro de 2024